Duas meta-explicações para melhor lidar com o cuidado de si

"Fractais" são padrões que se repetem em todas as escalas. Eles têm nos ajudado a pensar sobre os princípios da formação da vida, da mente e do universo, através da máxima da espiritualidade e do cuidado de si, "como acima, abaixo".
"Fractais" são padrões que se repetem em todas as escalas. Eles têm nos ajudado a pensar sobre os princípios da formação da vida, da mente e do universo, através da máxima da espiritualidade e do cuidado de si, "como acima, abaixo".
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Neste artigo, a partir do aforismo “conhecimento em si mesmo é poder”, apresento uma meta-explicação sobre a História da civilização ocidental, focando no paradigma atual, a saber, o materialismo científico, e como podemos melhor lidar com o cuidado de si na superação desse paradigma, abrindo espaço para o criativo cultural, a colaboração e a vida em comunidade.

O provérbio “Conhecimento é poder” é comumente atribuído ao filósofo e advogado inglês Francis Bacon. Na verdade, o que Bacon escreveu em suas Meditationes Sacrae foi o seguinte aforismo: “Conhecimento em si mesmo é poder”.

Pensado na perspectiva do cuidado de si, “conhecimento em si mesmo é poder” pode ser interpretado como o poder que nossas crenças (paradigmas ou programações mentais) tem para formar visões de mundo. Nesse caso, lidar com as visões de mundo é lidar com meta-explicações que justificam nossas crenças que, por sua vez, controlam nossos hábitos.

Com efeito, considero de suma importância o entendimento de duas meta-explicações para melhor lidar com o cuidado de si.

  1. A primeira é proveniente do biólogo americano, Bruce Lipton. Ela é denominada de “Biologia da crença” e está pautada na nova ciência da epigenética.
  2. A segunda é proveniente do filósofo americano Ken Wilber. Ela é denominada de “Visão Integral” e está pautada na teoria integral (ou movimento integral).

Vejamos a primeira neste artigo e a segunda em um próximo.

Cuidado de si na “Biologia da crença” de Bruce Lipton

Bruce Lipton traz um trabalho inovador no campo da nova biologia. Tal trabalho traz profundos impactos para a nossa visão de mundo, particularmente no que diz respeito a relação corpo e mente.

Juntamente com outros cientistas de ponta, Bruce vem analisando a interação entre mente e corpo e os processos pelos quais as células recebem informações. A tese central é a de que os genes e o DNA não controlam nossa biologia, como afirma as teorias da genética. Como assim? Em vez disso, eles provaram que o DNA é controlado por sinais externos à célula. Entre esses sinais, estão inclusive as mensagens energéticas que emanam de nossos pensamentos. Esse conhecimento é a base da nova ciência da epigenética. Ela está revolucionando o paradigma atual sobre como compreedemos a relação entre mente e matéria. Além disso, já há implicações dessa nova ciência sobre como devemos viver tanto nossa vida pessoal quanto a vida coletiva de nossa espécie.

E é aqui que entra a nossa questão do cuidado de si (micro-mudanças). Porém, antes veremos a macro-explicação de Bruce Lipton (Sobre a relação entre as macro-mudanças e as micro-mudanças de nossas crenças, eu escrevi no artigo anterior do Blog intitulado “O segredo da mudança de paradigmas“).

Perguntas perenes ou paradigmas basais

Para Bruce Lipton, essa mudança de sistema de crenças é essencial para a superação da crise atual da civilização. “Crises incentivam evolução”, ele afirma. Nesse sentido, a visão de mundo atual que se encontra em declínio é denominada de materialismo científico. Com ele, a evolução das visões de mundo, os sistemas de crença por trás das civilizações, são interpretadas a partir da relação entre o mundo físico (material) e o invisível (espiritual).

Com efeito, esses sistemas de crença podem ser recortados de acordo com o modo como cada civilização responde a três “perguntas perenes” ou “paradigmas basal”:

  1. Como é que chegamos aqui?
  2. Porque estamos aqui (propósito)?
  3. Como é que tiramos o melhor partido disso?

Vejamos o seu resgate da História da civilização Ocidental que nos fez chegar até a visão de mundo atual.

História da civilização Ocidental

  • Animismo: exemplos são os povos nativos e aborígenes; paradigma datado há cerca de 10 mil anos, acreditavam no equilíbrio entre matéria e espírito; acreditavam que chegamos aqui através do “pai céu” e da “mãe Terra”, com o propósito de “cuidar do Jardim”, tirando como proveito na Terra a aprendizagem de viver em harmonia com a Natureza.
  • Politeísmo: exemplos são o Monte Olimpo, povos egípcios, gregos e romanos antigos; paradigma datado há cerca de 4 mil anos, marcando o inicio do movimento de ênfase na espiritualidade dos deuses no mundo (separação entre individualidade e espírito), ao invés da espiritualidade do indivíduo com o Todo; acreditavam que chegamos aqui através do caos, portanto, não há um propósito específico, tirando como proveito para viver bem na Terra evitar irritar os deuses.
  • Monoteísmo: exemplos são o judaísmo e o cristianismo; sistema de crença dominante datado por volta de 800 D.C.; acreditavam que chegamos aqui através da supremacia de um Deus (não mais deuses), que sequer vive na Terra (insignificância do mundo material), e que dá a vida aos mortais através da intervenção divina, para cumprirem o propósito de jogar os “jogos da moralidade”, tirando o melhor partido na Terra ao obedecer as “leis da Bíblia”.
  • Reforma: exemplo é a Reforma Protestante de Martinho Lutero; datado por volta de 1500 D.C, acreditavam que chegamos aqui através da supremacia de um Deus que dá a vida aos mortais através da intervenção divina, para cumprirem o propósito de receber os presentes materiais dados por Deus aos escolhidos, tirando o melhor partido na Terra ao obedecer as “leis da Bíblia”.
  • Deísmo no Iluminismo: exemplos são os filósofos franceses René Descartes e Jean-Jacques Rousseau e o filósofo britânico David Hume, assim como a Declaração da Independência dos Estados Unidos da America; datado por volta de 1700 D.C., acreditavam basicamente que chegamos aqui através da supremacia de um Deus que dá a vida aos mortais através da intervenção divina, para cumprirem o propósito da razão, tirando o melhor partido na Terra através da aprendizagem de viver em harmonia com a Razão e a Natureza (e a religião dominante).
  • Materialismo científico: exemplo é o biólogo inglês Charles Darwin e a teoria da “Evolução das espécies”; paradigma datado de 1800 D.C, acreditava que chegamos até aqui através de acidentes no processo evolucionário, isto é, mutações aleatórias que culminou no homo sapiens, para cumprirem o propósito de turistas competindo pelos recursos no planeta, tirando o melhor partido na Terra ao encarar a luta pela existência que se baseia na sobrevivência do mais apto.

Um novo sistema de crenças está emergindo

Vamos entender um pouco melhor o paradigma atual, o materialismo científico. De acordo com Bruce Lipton, as diferentes ciências estão conectadas umas às outras através de conhecimentos fundamentais comuns em seus sistemas de crenças. Vejamos.

A matemática é a base de toda ciência. Posteriormente, está a física. Isso significa que não é possível conceber a física sem conhecimentos fundamentais da matemática. Em seguida, a partir da física, vem o entendimento da química, e da química vem o entendimento da biologia. Por sua vez, o entendimento da biologia fornece conhecimentos fundamentais ao entendimento da psicologia. Com efeito, a máxima da física newtoniana de que a matéria é primordial perpassa por todas essas áreas do conhecimento dentro do paradigma do materialismo científico.

Entretanto, esse sistema de crenças está deixando de ser dominante, está em mudança. O marco histórico dessa mudança ocorreu em 1953 quando os cientistas identificaram o DNA e afirmaram que o “segredo da vida” estava descoberto através do conhecimento sobre o gene. Na mesma baila, veio o Projeto Genoma Humano.

Curiosamente, entre os anos de 1953 e 2001 (anos de desenvolvimento do Projeto Genoma Humano), as pessoas começaram a se afastar da profissão médica convencional. Por um lado, passou a ser mais notório que a medicina convencional não funcionava completamente para dar respostas a todas as curas. Por outro lado, houve um interesse crescente em métodos alternativos. Aprendemos que 50 por cento ou mais da população procuram um profissional de medicina alternativa, complementar ou integrativa em vez de um médico convencional. Dito diferente, uma biologia baseada na física newtoniana é predominantemente mecânica e física. No processo de entendimento da doença e da cura, seu foco de atenção é a dimensão física e o instrumental do atendimento são exames laboratoriais, produtos químicos e drogas.

Aqui que entra a nova realidade científica da física quântica, com um novo sistema de crenças. Aqui, tudo é pautado na energia, tudo é energia. Vejamos o que está mudando com esse novo sistema de crenças:

  • Afirmar que tudo é energia não quer dizer que a matéria e as formas passam a ser insignificantes, pois busca-se novamente o equilíbrio (como no animismo).
  • Baseada na física quântica, a nova ciência da epigenética afirma que nossas percepções, emoções, crenças e atitudes tem a primazia na reescrita do nosso código genético, implicando na superação da afirmação de que são os genes que controlam a biologia, pois controlam a hereditariedade e, por fim, controlam nossa vida.
  • Baseada em novas interpretações da teoria darwiniana, a nova teoria da evolução afirma que chegamos até aqui por meio da cooperação e da vida em comunidade, implicando na superação da interpretação do individualismo darwiniano, da sobrevivência do mais apto.
  • A geometria fractal, uma compreensão matemática do universo, está corroborando a verdade da máxima espiritual “como acima, abaixo”, implicando que não chegamos aqui por acidente.

Novo paradigma civilizatório e o cuidado de si

Por meio dessas novas descobertas, vai se desenrolando um novo paradigma civilizatório.

Nesse caso, aprendemos que através das nossas percepções, podemos modificar cada gene em nosso corpo simplesmente modificando o modo como respondemos aos desafios da vida cotidiana. Com efeito, o papel de “vítima” dos nossos genes, da nossa hereditariedade, dos nossos ancestrais vai dando espaço para o papel de criativo cultural. Em outras palavras, é a nossa mente, a nossa consciência, o mundo imaterial que influencia a qualidade das nossas experiências e o desenvolvimento das nossas capacidades e potenciais.

Do mesmo modo, aprendemos que através da colaboração e da vida em comunidade, podemos viver em harmonia em busca daquilo que é suficiente, nem muito pouco nem demais. Com efeito, as teorias e sistemas de crenças errôneos, que mostram vantagem na competição cega, matando uns aos outros e roubando, vai dando espaço para a nova ciência. Em outras palavras, os impactos desse comportamento competitivo e de sobrevivência está ficando cada vez mais evidente para um número cada vez maior de pessoas.

E o que está ficando evidente? Que esse comportamento competitivo cego está levando a civilização atual a uma catástrofe.

Por fim, com o entendimento dessa meta-explicação, entendemos melhor a natureza do poder do criativo cultural bem como a natureza da colaboração para melhor lidarmos com o cuidado de si na mudança do paradigma atual. Entre as práticas do cuidado de si que corroboram com o novo paradigma, estão a meditação, o Jiu-jitsu, a resolução de conflitos baseada em princípios e os diálogos socráticos. Isso é bom!

By Beto Cavallari

Professor no Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) e no Departamento de Graduação em Ciências Sociais Aplicadas na Unimar. PhD em Filosofia pela Columbia University. Mestre em Filosofia pela Columbia University. Mestre em Educação pela Unesp/Marília. Especialista e Bacharel em Administração de Empresas.