Neste artigo, apresento a noção do poder da presença do professor espiritual alemão, Eckhart Tolle. Para ele, o poder da presença é a conscientização que liberta das amarras dos processos de pensamento habituais. Também apresento a relação entre o poder da presença e o amor. Por fim, trago algumas atividades propostas por Eckhart em uma de suas últimas palestras.
Para Eckhart Tolle, presença significa conscientização ou awareness. Essa presença é importante para lidar com aquela “voz na cabeça” que nos tem a maioria do tempo. Essa voz são os pensamentos automáticos ou processos de pensamento habituais condicionados na infância, na educação e nas diversas influências ao longo da vida.
Como sabemos, outros chamam essa voz por diferentes nomes. Bob Proctor a chama de paradigmas e Bruce Lipton a chama de crenças limitantes. O ponto é que, para eles, bem como para Eckhart, essa voz na cabeça refere-se ao diálogo interno que cada um tem consigo próprio. E esse diálogo é, em grande parte, prejudicial a nós mesmos.
Em outras palavras, é uma conversa desagradável, pois carregada de autocrítica e pré-julgamento baseados em conceitos mentais como arrependimento, ressentimento, culpa e falhas.
Para Eckhart,
Na verdade, milhões de pessoas são torturadas diariamente pela própria mente, pela conversa com a voz na cabeça. Essa negatividade interna pode ser vista como a condição da própria mente.
Para essas pessoas, há uma identificação com essa voz na cabeça. Por isso, elas pouco percebem ou refletem sobre essa voz, pois estão identificadas com ela e consequentemente agem de modo automático a partir do seu comando.
O grande desafio é perceber gentilmente o que envolve e dá forma e conteúdo a esses pensamentos. É perceber, sem autocrítica e pré-julgamento, não apenas o nosso pensamento, mas o como pensamos, o tom, a afetação, a vibração energética, o condicionamento, positivo ou negativo, a identificação, a intenção, enfim, conscientizar-se ou estar presente.
Poder da presença como conscientização
A presença é uma dimensão da consciência pela qual se começa a perceber ou se conscientizar, de maneira profunda e gentil, como se está à mercê dessa voz na cabeça. Lidar com a voz na cabeça apenas é possível por meio da percepção gentil do agora, nem no passado nem no futuro. Assim, a conscientização de si no agora é chamada de presença. Em outras palavras, quando o agora está pautado pela conscientização de si, isso é estar presença.
Como estamos a falar de um movimento duplo do pensar, isto é, a conscientização profunda dos sentidos, da consciência e da subconsciência, a presença não é, em si, um pensamento, um objeto abstrato. Ela é, enquanto conscientização, um estado de consciência libertador no tempo presente. Libertador em relação ao que ou quem? Aos pensamentos egóicas de si e os influenciados por outros, que acabam dominando o comportamento físico, mental e emocional, e condicionando a personalidade.
Porém, essa dimensão da consciência é ainda pouco experimentado e incorporado pelas pessoas. Dois expoentes marcantes da experiência e incorporação desse estado da consciência são Jesus e Buda (Sidarta Gautama). Eles são expoentes precisamente por serem exemplos de libertação do “eu” das amarras dessa identificação com a voz na cabeça. Em outras palavras, ao viverem a presença, ao se conscientizarem dessa voz na cabeça, eles foram capazes de dissolver o poder de suas identidades egóicas, suas personalidades condicionadas.
Eckhart traz esse ponto à luz assim:
Quando se identifica com aquele fluxo contínuo de pensamento, não se está a pensar, mas o pensamento ocorre em você sem você se dar conta. Você se identifica com esses pensamentos sem perceber que é a mente condicionada a pensar em ti. E à isso, você dá o sentido de um “eu” (self). Mas não existe “eu” algum nisso, como Buda já apontou no passado.
Para Eckhart, esse estado da consciência denominado de presença já foi visto como um luxo, praticado apenas por certas pessoas que não dependiam do puxa-e-empurra do viver da vida. Porém, com a situação crítica na qual a humanidade chegou, uma mudança nessa percepção está ocorrendo.
Com efeito, vejam a questão da presença na relação com a natureza. Começa-se a perceber que problemas como desastres naturais estão cada vez menos ocorrendo apenas como um… desastre natural. Ao contrário, cada vez mais os desastres naturais estão sendo causados pelo comportamento humano. O que equivale a dizer que estão sendo causados pela mente humana enquanto uma consciência disfuncional e causadora de sofrimento.
Isso também se aplica aos conflitos pessoais.
Poder da presença e a liberdade
Na questão da presença na relação com outras pessoas, se começa a perceber que conflitos humanos podem ter outros desfechos senão a briga, a separação ou mesmo a guerra. O poder da presença liberta das reações automáticas pelas quais a mente está condicionada pela antiga consciência, individualista e competitiva.
Nesse caso, a pessoa passa a perceber o modo como julga e critica continuamente o outro, e a si. Esse comportamento automático ou habitual passa a ser suspenso pelo poder da presença. Ele assim o faz através da conscientização sobre a voz na cabeça que instiga o julgamento e a crítica.
No lugar disso, passa-se a ocorrer despertares no modo de se relacionar com outras pessoas, com uma maior conscientização de que o medo e a infelicidade que dispara esses conflitos são muitas vezes gerados, criados na mente.
Para Eckhart,
Na maior parte dos casos, a pessoa se sente infeliz não por causa da situação em que ela se encontra, mas pelo o que a mente disse a ela sobre aquela situação.
Ele cita o exemplo de estar na fila, seja no aeroporto seja no supermercado. A fila não anda e as pessoas facilmente começam a se irritar. Para a maioria das pessoas, estar em uma fila não é algo necessariamente ruim a ponto de lhe trazer infelicidade. Porém, a voz na cabeça que comenta a situação faz com que essa situação seja interpretada como algo ruim e infeliz.
Estar presente nessa situação é conscientizar-se daquilo que a mente está dizendo e pausar, suspender a interpretação mental disfuncional da situação. Nessa situação da fila, ou mesmo em uma situação mais séria, estar presente é perceber que é a própria mente que acaba causando a infelicidade ao invés da própria situação em que se encontra. Nesse momento, há a potência da liberdade.
A liberdade provém do rompimento com as amarras da voz na cabeça. Como dissemos anteriormente, essa voz são os pensamentos automáticos ou processos de pensamento habituais condicionados na infância, na educação e nas diversas influências ao longo da vida. Nós não os escolhemos, mas, por serem automáticos ou habituais, eles nos escolhe e nos coloca à mercê da sua interpretação da realidade. Estar presente é conscientizar-se da possibilidade de escolha, de decidir se quer continuar a repetir esses pensamentos automáticos e infelizes ou se quer se libertar e passar a escolher os pensamentos que tens.
Por conseguinte, em muitas tradições espirituais, a libertação é entendida como uma transcendência da percepção da condição atual. Isto é, uma transcendência da percepção condicionada da atualidade. Se libertar das amarras da própria mente que cria infelicidade e sofrimento para você e os seus, isso é estar presente.
Poder da presença e o amor
Amor é geralmente interpretado como uma emoção forte em relação a outra pessoa. Isso é natural e justo. Este amor enquanto uma emoção forte é passível de se tornar o seu oposto, a saber, ódio. Ele não dura, como se vê muitas luas de mel virando um relacionamento que é fonte de infelicidade e ódio, culminando em separação alguns anos depois. Portanto, este não é o amor da presença.
Há algo mais profundo de que a emoção, nos seres humanos, que Eckhart se refere como um estado de ser. Esse estado de ser possibilita ver no outro algo que conecta os humanos, que liga profundamente, para além da superfície da personalidade e do sentimento amoroso transitório.
Afinal, o que é esse estado de ser? É o estado de consciência libertador denominado de presença.
Para Eckhart,
Quando se está presente com outro ser humano, se está livre das amarras do julgamento mental habitual. Está livre da estigmatização de rótulos sobre essa pessoa.
Isso é possível quando se está presente, pois é um estado de consciência do “eu” que nos livra das amarras do ego e da personalidade que cria infelicidade e sofrimento para si e os outros.
Quando se está presente, ama-se o outro como a ti mesmo. Isso não significa amar o ego ou a personalidade do outro. Isso não significa amar o outro na mesma quantidade que você se ama. Com efeito, portanto, isso significa que o amor verdadeiro é o reconhecimento da essência do outro como a tua própria, como a tua própria essência.
Foi Jesus quem afirmou isso de maneira impactante,
Amarás a teu próximo como a ti mesmo (Mateus 22:39).
Assim, para amar o próximo, enquanto amor verdadeiro, não é necessário estar em um relacionamento amoroso com o outro. Entretanto, para as relações amorosas serem justas, é necessário o despertar e a manifestação do verdadeiro amor.
Com efeito, o amor enquanto uma ligação emotiva forte e justa passa a ser secundário. Ele é secundário justamente em relação à ligação espiritual de aceitação abrangente da essência de todo ser humano, o que chamamos de verdadeiro amor.
É esse amor da presença que possibilita que o amor habite as relações humanas para além da estigmatização dos rótulos. É esse amor da presença que possibilita que o amor habite as relações amorosas mesmo no esquenta e esfria das paixões.
Exercício: estar presente
Neste exercício, tente observar o momento presente para melhorar a relação com o(a) companheiro(a) ou familiar. Tente permanecer no presente libertando a tua mente de rótulos negativos e preconceitos subconscientes que aprendeu ao longo da vida sempre que estiver com ele(a). Escreva os 5 pensamentos mais comuns que normalmente leva a desentendimentos com a pessoa amada:
- __________
- __________
- __________
- __________
- __________
1 comment
Comments are closed.